Saúde frágil de bebê prematuro não justifica reduzir indenização por infecção hospitalar que deixou sequelas
Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu que o fato de um bebê ter nascido prematuro e com baixo peso não poderia ter sido considerado pelo tribunal de origem como circunstância válida para o reconhecimento de concausa apta a diminuir o valor de indenização em decorrência de infecção hospitalar que deixou a criança com sequelas permanentes.
Como consequência, os ministros reformaram parcialmente o acórdão de segundo grau para, afastando a concausa, restabelecer indenização por danos morais de R$ 180 mil para a criança e R$ 90 mil para a mãe. O hospital onde a criança ficou internada também deverá custear tratamento médico e pagar pensão vitalícia de um salário-mínimo a partir dos 18 anos.
"A despeito de a prematuridade e o baixo peso serem fatores que potencializam o risco de infecções hospitalares, de acordo com o contorno fático delineado pela corte local, houve também o contágio de bebês sem essas características, ou seja, recém-nascidos que não eram prematuros, o que afasta a presunção de que tais condições foram determinantes para o contágio da infecção hospitalar", destacou o ministro Marco Buzzi.
O bebê e seu irmão gêmeo ficaram internados em UTI neonatal por terem nascido prematuros e com menos de 1,5 kg. No ambiente hospitalar, uma das crianças contraiu infecção hospitalar e, em razão disso, teve lesão cerebral e sofreu outros danos permanentes.
Em primeiro grau, o juiz fixou danos morais em R$ 100 mil para a criança e R$ 50 mil para a genitora. O valor total foi elevado para R$ 270 mil pelo tribunal em segunda instância, mas, por reconhecer que o quadro de saúde do bebê influenciou nas consequências da infecção hospitalar, a corte reduziu a verba indenizatória em 50%.
Antes da internação na UTI, gêmeos não foram diagnosticados com infecções
O ministro Marco Buzzi destacou que, de acordo com as informações dos autos, os bebês gêmeos, apesar de terem nascido prematuros e necessitarem de acompanhamento médico intensivo, não foram diagnosticados com infecções logo após o nascimento e apresentavam boas condições gerais de saúde.
Ainda segundo o relator, enquanto um dos irmãos gêmeos teve alta hospitalar sem qualquer dano à saúde, o bebê que contraiu a infecção teve paralisia cerebral e profundo retardo no desenvolvimento neuropsicomotor, sendo absolutamente incapaz para os atos da vida comum, como andar, sentar-se e enxergar.
"Em exame soberano das provas produzidas pelos litigantes, a corte [de segundo grau] salientou que, a despeito das conclusões teóricas alcançadas pelo perito judicial, no sentido de não ter ficado evidenciada a negligência por parte dos empregados da casa de saúde, os depoimentos dos médicos do estabelecimento demandado atestaram a existência de surto de infecção durante o período de internação do menor, o que extrapolou os padrões de normalidade de uma UTI neonatal", completou o ministro.
Tribunal de origem adotou teoria da equivalência, e não teoria da causalidade adequada
De acordo com Marco Buzzi, o tribunal de origem, apesar de reconhecer a falha na prestação de serviço pelo hospital, adotou a teoria da equivalência dos antecedentes para concluir que a prematuridade e o baixo peso do bebê foram predominantes para as sequelas causadas pela infecção hospitalar.
Entretanto, o ministro ressaltou que, em situações semelhantes, a doutrina e a jurisprudência adotam outra teoria, a da causalidade adequada, para verificação do nexo entre a conduta do fornecedor de serviços e os danos à vítima. O relator também pontuou que, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, o prestador de serviços responde independentemente de culpa pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeito no fornecimento.
No caso dos autos, o ministro Buzzi enfatizou que o quadro de saúde do bebê era conhecido do hospital e, por isso, deveria ter sido objeto de maior zelo no cumprimento dos protocolos sanitários. O que ocorreu, porém, foi uma série de infecções na UTI neonatal, ensejando, inclusive, a retirada dos bebês do local.
"Ressalte-se que as circunstâncias arroladas pelo hospital como supostos fatos exclusivos da vítima ou mesmo fatos preexistentes suficientemente capazes de dar ensejo ao quadro desenvolvido pelo infante, na verdade, consubstanciam-se em riscos intrínsecos à própria atividade desenvolvida pela casa de saúde, não se mostrando aptos a rechaçar o nexo de causalidade entre a falha no fornecimento do serviço e as sequelas sofridas pelo menor", concluiu o ministro.