Saída temporária de ano novo em Campo Grande tem evasão zero
Na capital, mais de 90% dos apenados em regime semiaberto trabalham em instituições públicas ou privadas por meio de parcerias e convênios firmados com o TJMS
Em dezembro de 2023, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul foi uma das 17 cortes estaduais que concedeu o direito à saída temporária de final de ano. Na capital do estado, os reeducandos do regime semiaberto deixaram a unidade prisional ou no Natal ou no Ano Novo. Nesta última data, todos que tiveram esse direito concedido retornaram ao Centro Penal da Gameleira, fazendo com que Campo Grande registrasse uma taxa de evasão zero.
Todos os anos, em especial após comemorações do Natal e do Ano Novo, o direito das pessoas privadas de liberdade à saída temporária volta a ser discutido. Instituto ainda muito incompreendido e, por conseguinte, criticado, a saída temporária é objeto, inclusive, de projeto de lei no Senado Federal para sua extinção. Contudo, esse é um direito essencial no processo de ressocialização. Nesse contexto, o TJMS, por meio de suas atribuições e em conformidade com a legislação, desempenha um papel decisivo na análise e na concessão desse direito, as quais começam no acompanhamento de perto de todo o cumprimento da pena.
A saída temporária está prevista na Lei nº 7.210/84, também chamada de LEP (Lei de Execução Penal). Os artigos 122 a 125 tratam especificamente do assunto e dispõem que este é um direito a ser concedido a pessoas privadas de liberdade em regime semiaberto que não foram condenadas por crimes hediondos que resultaram em morte, podendo deixar a unidade prisional apenas cinco vezes ao ano, por, no máximo, sete dias, sempre devendo respeitar algumas regras nesse período.
De acordo com referido diploma legal, a autorização para a saída é de competência do Juízo de Execução Penal, ouvido o Ministério Público e a administração penitenciária, e deve ter como objetivo a visita à família, a frequência a cursos profissionalizantes ou a participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social. Para ter acesso a esse direito, porém, os reeducandos do regime semiaberto precisam ter cumprido a fração mínima de um sexto da pena total se primária, ou um quarto se reincidente. Além do requisito temporal, é necessário que possuam comportamento adequado e que cumpram certas normas impostas pelo juízo, como fornecer o endereço onde reside sua família, informar o local onde poderá ser encontrado durante a saída, recolher-se no período noturno, não frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres, entre outros.
Importante destacar que o regime semiaberto, único com a possibilidade de recebimento do direito, consiste naquele em que os reeducandos já deixam a unidade prisional durante o dia para trabalhar ou estudar em locais previamente definidos, regressando apenas no período noturno.
A esse respeito, em Campo Grande, mais de 90% dos apenados em regime semiaberto trabalham em instituições públicas ou privadas por meio de parcerias e convênios firmados com o TJMS, como a criação da Padaria na Gameleira e o fornecimento de mão obra prisional para construção de escolas na zona rural e para reforma de instituições de ensino estaduais. Seja para começar a exercer uma atividade laborativa, seja na fiscalização desta, um trabalho criterioso de acompanhamento dos presos é feito na Capital. Esse olhar mais atento aos reeducandos, por sua vez, assegura um efetivo cumprimento de pena que atenda sua função reparatória, bem como permite a concessão de direitos e benefícios com maior acuidade, garantindo, desse modo, bons resultados na ressocialização.
Assim, de acordo com dados fornecidos pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), tão somente 179 receberam o direito de passar as comemorações do réveillon em casa, e 100% retornaram a Gameleira posteriormente.
Válido frisar que ao não cumprir as condições impostas para a autorização, automaticamente o reeducando perde o direito. Também se revoga o direito caso a pessoa pratique um crime doloso, for punida por falta grave no cumprimento da pena ou revelar baixo grau de aproveitamento no curso que frequenta durante a saída temporária. Para recuperá-lo, é preciso haver o cancelamento da punição disciplinar ou a demonstração de merecimento.
Em um sistema penal pautado pela busca da ressocialização, a saída temporária desempenha um papel relevante ao proporcionar aos reeducandos a oportunidade de reconstruírem laços familiares, adquirirem novas habilidades e se reintegrarem à sociedade de forma gradual e supervisionada. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, por meio de sua atuação responsável e criteriosa, busca equilibrar a necessidade de punição com a esperança de reinserção, reconhecendo a importância desse direito como um instrumento de transformação e recuperação.