Defensoria de MS garante indenização a presos por superlotação em celas

Em abril de 2016 a capacidade do estabelecimento prisional era de 327 detentos, mas havia 1.280 encarcerados

  • Redação com Defensoria Pública MS
Imagem ilustrativa/Foto: Reprodução/TST
Imagem ilustrativa/Foto: Reprodução/TST

‌A Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul conseguiu a condenação do Estado ao pagamento de indenização por danos morais individuais e ao pagamento de danos morais coletivos à sociedade em virtude da condição de superlotação das celas do Instituto Penal de Campo Grande.

O defensor público de Segunda Instância Francisco José Soares Barroso - responsável pela ação e, à época, coordenador do Núcleo Ações Estratégicas (NAE) -, destaca que este é o trabalho da Defensoria, garantir que os direitos de todas e todos sejam respeitados.

“A Defensoria atua na defesa de parte da população carcerária do Estado de Mato Grosso do Sul, que em sua maioria é carente e vive em condições inadequadas no estabelecimento IPCG, sendo que o Estado tinha ciência de tal situação ao menos desde o ano de 2016, inclusive foi condenado em outra ação civil pública a resolver a questão da superlotação carcerária, mas sem solução definitiva até o momento. Este é o trabalho da Defensoria garantir que os direitos de todas e todos sejam respeitados”, pontua o defensor público Segunda Instância Francisco José Soares Barroso.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a violação massiva de direitos fundamentais no sistema prisional brasileiro, e o coordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário (Nuspen), defensor público Cahuê Urdiales, pondera que a pauta é um debate constante da Defensoria e, em Mato Grosso do Sul, é realizado um mapeamento da situação, por meio de inspeções. “Há, no Brasil, um claro e indisfarçável estado de coisas inconstitucional resultante da omissão do poder público para neutralizar essa situação”, pontua o coordenador do Nuspen, Cahuê Urdiales.

‌O caso

Em 2016 foi instaurado o Procedimento para Apuração Preliminar dos fatos (PAP) n.º 030/2016, pelo defensor público de Segunda Instância Francisco José Soares Barroso, à época coordenador do Núcleo Institucional de Ações Estratégica (NAE), tendo por objeto a existência de superlotação carcerária no Instituto Penal de Campo Grande (MS), bem como buscar solução — extrajudicial ou judicial — para adequá-lo à sua real capacidade.

Sem solução extrajudicial, a Defensoria ajuizou a Ação Civil Pública para obrigar o Estado a construir novas Penitenciárias; condenar o Estado ao pagamento de danos morais a cada preso por dia de permanência nas celas do Instituto Penal de Campo Grande em condições de superlotação; e condenar o Estado ao pagamento de danos sociais para um fundo ou mesmo para uma instituição.

Conforme o processo, desde o ano de 2016, a Defensoria de MS verificou condição de superlotação do Instituto Penal de Campo Grande, sendo que no mês de abril de 2016 a capacidade do referido estabelecimento prisional era de 327 detentos, mas havia 1.280 encarcerados, e em julho do mesmo ano houve um aumento da população carcerária para 1.315 detentos, com pouca redução até o mês de novembro daquele ano para 1284.

No mês de março de 2017, houve o agravamento da situação e o Instituto Penal de Campo Grande, cuja capacidade é de 327 detentos, passou a abrigar 1.341 pessoas, enquanto no mês de dezembro daquele ano o contingente passou a ser de 1.288 detentos.

Mantendo-se a situação de superlotação, a população carcerária do Instituto Penal de Campo Grande era de 1.450 detentos no mês de fevereiro de 2019, 1.453 em novembro de 2020, 1.583 em abril de 2021, 1.441 em abril de 2022 e 1.340 detentos em novembro de 2022.

Não houve construção de presídios

O aumento de presos no decorrer do anos demonstrou, portanto, que, embora o Estado sustente haver promovido medidas a fim de solucionar ou dirimir a superlotação carcerária, como a construção de novos estabelecimentos prisionais e transferências de detentos para outros locais, tais medidas foram insuficientes, mantendo-se a vexatória situação de ocupação do Instituto Penal de Campo Grande, ao menos desde o ano de 2016, constituindo prova viva da falência institucional do sistema prisional como ressaltado na ADPF n.º 347, haja vista que até o momento existem apenas promessas dos entes públicos para a regularização da situação, sem, contudo, efetiva solução do problema.

Indenização por danos morais individuais

A superlotação carcerária do Instituto Penal de Campo Grande é conhecida desde o ano de 2016 e o Supremo Tribunal Federal firmou tese vinculante no sentido de que o Estado responde por eventuais danos sofridos pelo detento em razão da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.

Fato que ficou demonstrado, haja vista que o referido estabelecimento penal possui capacidade máxima para abrigar 327 detentos e na última contagem, que se deu no mês de novembro de 2022, possuía lotação de 1.342 internos, ou seja, mais de 400% de sua capacidade, cabendo destacar que a superlotação carcerária do referido estabelecimento penal sequer é controvertida nos autos.

É evidente, portanto, que os presos internos nas celas do Instituto Penal de Campo Grande em condições de superlotação suportaram prejuízo moral individual que ultrapassa o mero dissabor e caracterizou-se o dano moral individual por ato ilícito do requerido.

Os interessados

Considerando a natureza da indenização por danos morais individuais, cabe ao interessado, individualmente, promover o respectivo cumprimento de sentença, devendo demonstrar sua legitimidade, isto é, que está ou esteve preso (condenado/definitivo, provisório ou temporário) no Instituto Penal de Campo Grande a partir do ano 2016.

Além disso, o assistido deverá provar que na época de reclusão havia superlotação carcerária, além de não haver promovido ação judicial individual buscando idêntica pretensão ou que pediu a suspensão do respectivo processo na forma do artigo 104 do Código de Defesa do Consumidor, o que configuraria fato novo.

Indenização por dano moral coletivo

A superlotação carcerária do Instituto Penal de Campo Grande perdura por anos sem solução definitiva do problema pelo Estado, apesar de seu conhecimento dos fatos, o que por si só releva a prática de ato ilícito e deixa evidente a configuração do dano moral coletivo.

Assim, o juízo fixou a indenização por dano moral coletivo em R$ 200 mil, a ser revertido ao Fundo Penitenciário Estadual — Funpes/MS ou outro indicado, para desenvolvimento, modernização e aprimoramento do sistema prisional deste Estado.

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