TCE aponta irregularidades em contrato com empresa que ‘fornece merendeiras’
Estudo do Tribunal de Contas do Estado indica que dispensa de licitação feita pela Prefeitura de Dourados tem sobre preço de R$ 336 mil
O TCE-MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul) constatou irregularidades no contrato de R$ 1,9 milhão firmado em setembro de 2017 entre a Prefeitura de Dourados e a Energia Engenharia Serviços e Manutenções Ltda. – EPP para o fornecimento da mão de obra de 97 merendeiras à rede municipal de ensino por seis meses. Além de apontar impedimento legal para a dispensa de licitação realizada pelo município, o órgão critica a falta de planejamento dos gestores públicos e indica sobre preço superior a R$ 300 mil nos pagamentos.
Em relatório ao qual a 94FM teve acesso com exclusividade, finalizado no dia 8 passado pela 6ª Inspetoria de Controle Externo, sob a relatoria do conselheiro Márcio Campos Monteiro, é determinada a intimação dos gestores municipais para prestarem esclarecimentos. São solicitados holerites e folha de ponto de todos os funcionários contratados, além de toda a execução contratual.
Publicado na edição do dia 2 de outubro de 2017 do Diário Oficial do Município, o Extrato do Contrato nº 322/2017/DL/PMD indicou a contratação da Energia Engenharia Serviços e Manutenções Ltda - EPP como empresa especializada "para prestação de serviços de merendeira em atendimento à Rede Municipal de Ensino com fornecimento de mão de obra". Com prazo de 180 dias contados a partir da data de assinatura do contrato, 21 de setembro, essa dispensa de licitação tem valor total de R$ 1.958.220,48.
SOBRE PREÇO
No entanto, o TCE informa ter realizado um estudo “no qual foi possível concluir que os valores informados nos custos indiretos de lucro estão muito acima da realidade de mercado”. “Analisando a Planilha de Custo e Formação de Preços apresentada pela empresa Energia Engenharia Serviços e Manutenções LTDA., foi possível detectar que a mesma foi adulterada para que se chegasse a um determinado valor”, argumentam os auditores, que classificaram o documento enviado pela empresa como sem serventia “de parâmetro para essa contratação, pois simplesmente as informações constantes não são reais”.
O relatório aponta que o valor por merendeira no contrato analisado é de R$ 3.364,64 por mês, mas poderia ser de R$ 2.785,76 caso não houvesse o sobre preço constatado no total pago pelo município. “Desta forma, existe um sobre preço no contrato assinado no valor de R$ 336.908,16 (trezentos e trinta e seis mil, novecentos e oito reais e dezesseis centavos), sugerimos a glosa desse valor, para que esses recursos retornem aos cofres públicos”, consta no documento.
DISPENSA IRREGULAR
Outra irregularidade apontada pelo TCE diz respeito à dispensa de licitação utilizada pela prefeitura para contratar essa empresa. Os auditores citam a existência de outro procedimento desta natureza para contratação do mesmo serviço, pela mesma empresa, em março do ano passado. “Desta feita o que o ordenador de despesas está tentando fazer é uma prorrogação desse contrato, pois é a mesma empresa que está sendo contratada nesta dispensa de licitação em estudo, para realizar o mesmo serviço (contratação de merendeiras) pelo período de 180 dias”.
O relatório do Tribunal de Contas menciona ainda que o procurador do município eximiu-se de posicionar a respeito desta contratação por dispensa de licitação, encaminhando a documentação para os secretários municipais de Fazenda e de Educação, “sugerindo inclusive que fosse aberto um processo administrativo para averiguar a responsabilidade dos servidores envolvidos que não conseguiram contratar o serviço por meio de licitação”.
ESCLARECIMENTOS
Em referência à ex-secretária de Educação, Denize Portolan de Moura Martis, o TCE aponta a justificativa apresentada por ela de que não houve tempo hábil para executar tal procedimento licitatório. “A falta de merendeiras já existia desde março quando foi assinado o primeiro contrato por dispensa de licitação para contratação desse serviço, sendo assim não era possível assinar um novo contrato utilizando-se do mesmo amparo legal, isso demonstra falta de planejamento do órgão”, pontua o relatório.
A auditoria afirma ainda que em consulta ao CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) da empresa não foi possível localizar “entre suas atividades principais ou secundárias a prestação do serviço merendeira”. Também neste tópico são solicitados esclarecimentos. Outros documentos não remetidos para análise, conforme os auditores do TCE, devem responder a “razão da escolha do fornecedor ou executante, razão da escolha do fornecedor ou executante, justificativa do preço, e parecer jurídico sobre a minuta contratual ou instrumento equivalente”.
INQUÉRITO NO MPE
Conforme revelado pela 94FM em outubro passado, esse contrato já é alvo do Inquérito Civil nº 06.2017.00001908-8, instaurado pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual) para "apurar a legalidade do processo de Dispensa de Licitação n. 056/2017 do Município de Dourados, que teve por objeto a contratação de empresa especializada para a prestação de serviços de merendeira em atendimento à Rede Municipal de Ensino com fornecimento de mão de obra".
Conforme manifestação do promotor Ricardo Rotunno, da 16ª Promotoria de Justiça da Comarca, motivaram a investigação "o vultuoso valor envolvido na contratação, aliado a constatações iniciais que apontam para o desempenho tão somente de atividades outras, não relacionadas ao objeto da contratação, pela empresa contratada".
CRIANÇAS ALIMENTADAS
Intimados neste inquérito, os investigados já apresentaram suas justificativas. A Procuradoria do Município alegou ter sido necessária a dispensa de licitação porque o quadro de funcionários municipais para o cargo de merendeiras é “bastante baixo, de modo que não cobre toda a demanda desses profissionais nas escolas e CEIM’s municipais”.
Por esse motivo, argumenta que contratação emergencial das 97 merendeiras por R$ 1,9 milhão “é de extrema necessidade para desenvolver a atividade de elaboração dos alimentos (merenda) nas escolas e CEIM’s desde o início das aulas na rede pública municipal, não podendo sofrer interrupções, sob pena de deixar muitas crianças sem refeição”.
PREÇOS CONDIZENTES
Já a Energia Engenharia Serviços e Manutenções Ltda. – EPP diz participar de “diversos certames públicos de concorrência sem maiores problemas, inclusive em órgãos federais, estaduais e municipais”. No caso investigado, afirma que “apenas participou do processo licitatório de emergência (contratação emergencial)” da prefeitura “pelas razões pré-estabelecidas pelo contratante”, sem ter obrigação de “avaliar a existência ou não das situações urgência/emergência que motivaram o município de Dourados em contratar mão de obra da forma em que o fez”.
“Por fim, apenas como premissa inicial e essencial, cabe destacar também que os preços de mão de obra estão condizentes com as planilhas apresentadas pelo Município, as quais foram aceitas por esta Empresa, que viu viabilidade em participar do certame (que contou com outros licitantes), e acabou sagrando-se vencedora, valores inclusive alcançados através de parâmetros e diretrizes legais, inclusive seguidos por diversos outros órgãos públicos que contratam mão de obra”.