‘Nem santo adivinha’ onde servidor da Câmara de Dourados fica no horário de trabalho, diz oficial de Justiça
Carlinhos Cantor e o vereador Idenor Machado são réus em ação por improbidade administrativa junto com o Procurador Jurídico do Legislativo
Um dos três réus de Ação Civil Pública por improbidade administrativa que tramita na 5ª Vara Cível de Dourados, o servidor da Câmara Municipal Carlos Roberto Assis Bernardes, o Carlinhos Cantor, é figura difícil de ser encontrada até no local de trabalho em horário de expediente. A informação é do oficial de Justiça designado para citá-lo sobre a movimentação do processo de número 0803477-94.2014.8.12.0002.
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Em certidão divulgada no site do TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) dia 8 de abril, o oficial de Justiça Severo F. Santos informou ao juiz Jonas Hass Silva Júnior, responsável pelo caso, que no endereço onde mora o réu, “gastou os dedos” de tanto tocar a campainha. E no trabalho do mesmo, a Câmara de Vereadores, foi informado de que só o encontraria “bem cedo e depois, nenhum santo iria adivinhar onde ele estaria”.
Curso de inglês
Somente no dia 28 de março, na sétima diligência e 14 dias após a primeira tentativa, o oficial de Justiça conseguiu encontrar Carlinhos Cantor no local de trabalho. Ex-vereador (2003 a 2008) e vice-prefeito na gestão Ari Artuzi (2009 a 2010), ele é servidor efetivo da Casa de Leis desde 1989 e figura na condição de réu, junto com Idenor Machado (PSDB) e Sérgio Henrique Pereira Martins de Araújo, presidente e Procurador Jurídico da Câmara, respectivamente, em processo por improbidade administrativa.
Como noticiou em primeira mão a 94 FM no dia 11 de março deste ano, a Ação Civil Pública movida pelo MPE (Ministério Público Estadual) denuncia suposta ilegalidade na concessão de licença remunerada para capacitação no exterior ao funcionário do Legislativo. Carlinhos Cantor passou sete meses nos Estados Unidos, onde deveria, segundo os promotores, ter feito especialização stricto sensu em nível de mestrado ou de doutorado, como prevê a legislação, para ter recebido o benefício. Mas trouxe apenas um certificado de curso de inglês.
Denúncia aceita
A denúncia do MPE chegou ao Judiciário no dia 25 de abril de 2014, assinada pelos promotores Luiz Gustavo Camacho Terçariol e Amilcar Araújo Carneiro Júnior, responsáveis à época pelas 12ª e 16ª promotorias, respectivamente. Além da ilegalidade da licença remunerada, eles acusam o presidente e o Procurador Jurídico da Câmara de Vereadores de terem omitido a portaria que concedeu o benefício.
Em novembro de 2015 o magistrado responsável pelo caso aceitou a denúncia e os citados passaram a figurar como réus no processo. Se condenados, podem ser punidos com a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos de oito a 10 anos, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário. O MPE pede a devolução de R$ 66.596,40 aos cofres públicos municipais, soma dos salários pagos pela Câmara a Carlinhos Cantor (os valores brutos chegaram a R$ 8.808,82 em junho de 2012) enquanto esteve fora do Brasil.
Difícil de encontrar
A citação de Carlinhos Cantor, que deu tanto trabalho, é justamente parte da sequência do processo. O vereador Idenor Machado já havia sido citado no dia 8 de março, por outro oficial de Justiça. No dia 14 daquele mês o responsável por encontrar o servidor efetivo da Câmara fez a primeira diligência, onde seria a casa dele. Mas foi informado por um morador que o requerido residiria em outra residência, próxima ao Fórum.
“[...] por diversas vezes não logrei encontrar o requerido, sendo que pode tocar a campainha até gastarem os dedos. Em uma das diligências, fui informado de que o requerido poderia ser encontrado na Câmara Municipal de Dourados. Várias diligências restaram vãs, sendo informado na penúltima de que o requerido poderia ser encontrado bem cedo e depois, nenhum santo iria adivinhar onde ele estaria”, informou o oficial de Justiça no relatório entregue ao juiz responsável pelo caso.
Nenhum santo adivinha
Essas tentativas de encontrar Carlinhos Cantor começaram no dia 14 de março, ocasião em que o oficial de Justiça foi ao primeiro endereço às 14h57. Às 18h10 ele visitou a segunda casa indicada como moradia do réu. Dia 21 de março o servidor do Judiciário voltou a essa residência às 17h52. Teriam sido as ocasiões em que a campainha foi tocada até “gastarem os dedos” sem que alguém lhe atendesse.
Ainda no dia 21 de março, uma segunda-feira, o oficial de Justiça foi até o Palácio Jaguaribe, sede do Legislativo municipal. Mas chegou às 18h45 e o expediente na Câmara atualmente é das 7h às 13h. Então ele voltou à Casa de Leis no dia 22 (terça-feira) às 10h12 e no dia 23 (quarta-feira) às 10h50. Nessa última oportunidade, ouviu que “o requerido poderia ser encontrado bem cedo e depois, nenhum santo iria adivinhar onde ele estaria”.
Com essa informação, o oficial de Justiça voltou à Câmara de Vereadores na semana seguinte, dia 28 de março, outra segunda-feira, às 8h25. E relatou: “No dia de hoje, após esperar bastante tempo, CITEI por todo teor deste mandado e da inicial ao Sr. CARLOS ROBERTO ASSIS BERNARDES (também conhecido por "Carlinhos Cantor"), do qual bem ciente ficou, aceitando a contrafé que lhe ofereci, apondo sua assinatura que vai ao anverso”.
*Matéria editada às 11h59 para correção. O verbo "adivinhar" estava grafado de forma incorreta no título.