MPF e DPU movem ação para garantir reserva de vagas a pessoas negras e indígenas em concursos de Dourados

Estado brasileiro assumiu compromisso internacional de adotar políticas afirmativas a grupos vítimas de discriminação

  • Assessoria/MPF-MS
Prefeitura não acolheu a recomendação (Foto: Divulgação/Prefeitura de Dourados)
Prefeitura não acolheu a recomendação (Foto: Divulgação/Prefeitura de Dourados)

O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Público da União (DPU) moveram uma ação para obrigar o Município de Dourados a reservar 20% e 3% de vagas em concursos públicos municipais a pessoas negras e indígenas, respectivamente. O processo foi protocolado na Justiça Federal no último dia 21, data em que se celebra o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU).

O MPF e a Defensoria Pública do Estado do Mato Grosso do Sul (DPE-MS) já haviam emitido uma recomendação ao Município de Dourados para que adotasse política de cotas raciais após a prefeitura lançar edital com reserva de 10% das vagas, do total de 57, apenas a pessoas com deficiência. A prefeitura, no entanto, não acolheu a recomendação sob a alegação de que não havia lei municipal que previsse as cotas e que o executivo só poderia agir dentro das previsões legais existentes.

No entanto, de acordo com o MPF e a DPU, o Estado brasileiro é signatário da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, da Organização dos Estados Americanos (OEA), que prevê, dentre outras medidas, a obrigação de adotar políticas especiais e ações afirmativas necessárias para assegurar os direitos e liberdades fundamentais de grupos sujeitos à discriminação racial e outras formas de intolerância, em busca de condições de igualdade de oportunidades. No Brasil, a convenção tem valor de norma constitucional e deve ser obrigatoriamente cumprida. Além disso, o país também aderiu à Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, da ONU, que traz previsão semelhante.

O MPF e a DPU esclarecem que a política de cotas busca consolidar a efetiva igualdade entre as pessoas prevista pela Constituição e está diretamente relacionada com o dever do poder público de assumir condutas para assegurá-la. “As ações afirmativas objetivam equalizar os grupos que, por questões históricas, culturais, econômicas e sociais, encontram-se em situação de desigualdade e enfrentam a discriminação, e surgem a partir do reconhecimento de que não basta que o Estado assuma uma postura neutra para a diminuição e erradicação das desigualdades, mas que passe a agir positivamente”, argumentam os órgãos na ação.

Racismo estrutural – Para o procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida e a defensora pública federal Natália Von Rondow, a omissão do Município em implementar a ação afirmativa de cotas raciais, apesar do compromisso internacional firmado pelo Estado brasileiro, é uma expressão do racismo estrutural, que, muitas vezes, se refere a práticas aparentemente neutras no presente, mas que perpetuam os efeitos da discriminação no passado.

“O racismo estrutural constitui um mecanismo que garante, por meio da seleção, a exclusão de grupos raciais diferentes, sejam eles compostos por pessoas negras, indígenas, ciganos, ou outros, de modo que essa estrutura funciona como uma forma de segregação por meio das próprias instituições do governo”, argumentam o procurador e a defensora. “Esse racismo estrutural induz, mantém e condiciona a organização e ação do Estado, suas instituições e até mesmo as políticas públicas adotadas”, declaram, na ação.

Conforme o MPF e a DPU sustentam, “o racismo institucional, notadamente nas instituições públicas, constitui a manifestação mais grave do racismo estrutural, uma vez que manifesta o expresso descumprimento estatal de respeitar os direitos humanos de grupos minoritários”.

Na ação, além do pedido para imediata reserva de vagas a pessoas negras e indígenas, os órgãos pedem a condenação do município de Dourados, ao final do processo, ao pagamento de danos morais coletivos porque a omissão do poder público afeta a dignidade da pessoa humana, gerando constrangimentos e humilhações, que podem caracterizar ofensa à honra. O MPF e a DPU pedem que os valores sejam revertidos à comunidade indígena.


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