Artigo: Ex-prefeitos condenados; onde estavam os vereadores?
A condenação de dois ex-prefeitos de Dourados por improbidade administrativa evidencia o quanto a Justiça pode ser, além de tardia, leniente com a ilicitude. Ao punir ex-chefes de Executivo por infrações cometidas há pelo menos uma década, o Judiciário esqueceu, talvez pelo tempo transcorrido, que numa administração pública o erro de um conta invariavelmente com a conivência de muitos para ganhar corpo e trazer prejuízos à coletividade. Nesse caso, onde estavam os vereadores?
Não se trata de questionar a necessidade da punição a gestores desonestos. As decisões contrárias a Antonio Braz Genelhu Melo (PRB) - que administrou Dourados de 1989 a 1992 e de 1997 a 2000 - e a José Laerte Cecílio Tetila (PT) - de 2001 a 2008 - são consequências de irregularidades identificadas pelo MPE (Ministério Público Estadual) e reprovadas por um magistrado de forma legítima. Mas tais ilicitudes só ganharam proporções condenáveis porque o sistema democrático no qual estamos inseridos não funcionou plenamente. O Legislativo foi, como ainda é, omisso.
Braz Melo, por exemplo, foi condenado por ter doado “terrenos em favor de servidores públicos que não preenchiam os requisitos legais exigidos na época para o benefício custeado por recursos públicos”, conforme o MPE.
Já Tetila acaba de ser punido pela “aquisição de diversos veículos com a cor vermelha, alusiva à sua agremiação partidária (PT), na escolha de placas que contivessem numeração final 13 e a criação de diversos loteamentos populares, consignando na sua denominação a expressão “Estrela”, em alusão ao seu partido, tudo com recursos públicos e com a finalidade de produzir associações de ideias com a cor, número e símbolos utilizados em campanhas eleitorais pelo partido do qual o réu é filiado”.
As condutas desonestas desses gestores encontraram campo fértil para crescerem devido à complacência do poder Legislativo, cenário comum ainda hoje. Com vereadores dispostos a exercer na plenitude suas funções, as condenáveis iniciativas desses ímprobos prefeitos teriam sido inibidas ou imediatamente punidas dentro da própria Casa de Leis. Não desembocariam no Judiciário com o atraso que vemos.
É certo que Braz Melo e os outros seis servidores condenados junto a ele tenham de devolver ao patrimônio do município o que conseguiram de forma ilícita, seja com os bens ganhados ou dinheiro lucrado. Também que Laerte Tetila ressarça aos cofres públicos municipais “os valores ilicitamente despendidos para sua autopromoção”, como definiu o juiz no despacho. Mas é preciso repensar o papel do vereador na administração pública.
Observa-se cada vez mais um discurso uníssono dentro da Câmara de Dourados. O prefeito Murilo Zauith (PSB) é tido como uma unanimidade, um ser inquestionável, quase que divino aos olhos da maioria dos parlamentares. Até mesmo alguns dos eleitos por chapas contrárias a do mandatário não resistiram às benesses do poder e engrossaram as fileiras governistas; calam diante de desmandos. Existe até oposicionista que late, mas não morde, afeito tão somente a discursos inflamados na tribuna. Oposição de fato virou artigo de luxo.
As condenações recentes podem ser o prenúncio do futuro de Zauith. O socialista já enfrenta problemas com o MPE por autopromoção com recursos públicos e por doação de terreno do município a empresa privada. Essas práticas apontadas como ilícitas pela Promotoria não ecoam onde deveriam, no Legislativo. Mas é possível que a Justiça venha a ser feita daqui a 10 anos, da mesma forma tardia e leniente com a ilicitude como vemos agora. No entanto, que também os complacentes vereadores da atual legislatura sejam lembrados numa próxima decisão judicial.